terça-feira, outubro 20, 2009

Lado a lado

O tempo não tem princípio nem fim
Ele passa por nós medido em anos-luz
Mas enquanto o tempo for eu sem ti
O tempo nada me diz
O tempo não me seduz.

O espaço é tão infinito
Definido por tantos contornos
Onde, bem alto, lanço o meu grito
Se no espaço não vejo teus adornos
Se no espaço em nada me torno.

O tempo e o espaço caminhando lado a lado
Preencherão o copo vazio,
Talvez
Assim escrevamos o nosso fado.

S.

Ó olhos cristalinos cor do céu
Ó negros cabelos de transcendental leveza
Ó finíssimos lábios de inefável doçura,
Se vós sois mesmo verdadeiros,
Como não posso eu viver na incerteza?

Circo do Amor

Triste palhaço, por que ris
Se ninguém repara em ti
Nas tuas acrobacias e tropelias
Nos teus mortais sempre falhados
Nesse jeito desengonçado
De pedir um pouco de amor.

Pobre palhaço, por que gastas
Piruetas e saltos numa ânsia
Para depois negar o cansaço
(Esse sim, pula à vista)
Na busca de um quente abraço
Que te sopre calor.

Meu palhaço grande,
De olhar esbugalhado
Aspecto reservado
Não interrogues mais a tua sorte
Pendura longe esse roto fato
E morre...

sábado, outubro 10, 2009

Fábrica de soldados

Glória, soldado, aleluia!
Condecoremos o corpo
Que inerte e frio jaz
Bravo soldado, grande morto
"Tanta falta nos faz."
Espetar-te-emos nessa farda
A medalha pela honrosa prestação
Com sangue, defendeste a nação
Roubando o relógio do teu irmão.
És um herói transformado
Em efeméride esquecida
Uma data perdida
No calendário de violações,
Sequestros, assaltos à mão armada
Que hoje espezinham com dor
Cada pedra da calçada.

Como tu havia milhões (quantos?)
E mais se irão fabricar
Continuamente...

Rodopio Infernal

Depressa, vive depressa
Antes que a morte venha
Te buscar
Despacha-te, decide
Num relâmpago
Em quem vais apostar
E fuma mais um cigarro
Não sentes os nervos a pular?
O teu chefe, esse sacana
Voa num jacto particular
Enquanto tu, com a pressão
Mal consegues respirar.
Distraíste-te!...
Isso podia ser fatal...
Vá, calma, relaxa,
Concentra-te
Ou a tua família
Nem conhecerá o Natal.
Vamos lá
Ágil, compra e venda
Num rodopio infernal.
Sentes-te inseguro?
Arrisca,
Também poderá ser genial.
Aguenta coração,
Não explode
É só mais uma transacção
Precisas de fazer dinheiro
Para te manter na prisão.
Pronto, por hoje já está
Agora resta rezar
Com sorte nada acontecerá:
Não parará o coração
Nem haverá morte cerebral.

Amanhã bem cedinho
Não te esqueças de tomar
Em segredo, à sucapa
O comprimido habitual.

quarta-feira, outubro 07, 2009

Doente

Estou doente...
Muito doente...
E fraco, imóvel,
Quieto, estático,
Paralisado, fixado
E fixando
Teu rosto,
Teu sorriso,
Meu paraíso!...
Estás longe
Estou perto
De mim
Da loucura...
E perdura...
Que sensação
Sensacional
Sensasionalista
Esta de perder
Por querer,
Sofrer
Por perder...
Querer para sempre
Não querer
Num instante...
Degradante!

Será possível
Compreensão humana?

segunda-feira, outubro 05, 2009

A Manuela

A Manuela, sentada à janela,
espera que passe o seu grande amor.
Ele não passa, ela desespera,
aí vem um rico para seu servidor:

"Ó meu diamante, como posso eu polir-te?
Cobrir-te-ei com bronze, prata e ouro
do mais caro deste mundo. Se isto te não chegar,
dou-te um castelo com vista para o mar."

"Podes guardar teu ouro, prata e bronze
e teu mar e teu castelo. Não os quero!
Não quero valores, quero algo belo.
Vai-te embora, vai, por outro eu espero."

A Manuela, sentada à janela,
espera que passe o seu grande amor.
Ele não passa, ela desespera,
aí vem um pedante para seu servidor:

"Ó meu coração, como posso eu aconchegar-te?
Minha beleza te deverá bastar,
mais meus cabelos sedosos e me torno
de certeza, em teu favorito adorno."

"Podes guardar toda a tua beleza
tua seda e tua certeza. Não as quero!
Vai-te embora, vai, por outro eu espero.
Não quero um adorno, quero um sincero."

A Manuela, desesperada à janela,
sentada espera o seu grande amor.
Ele não passa, ela ainda espera
aproxima-se alguém para seu animador:

"Os meus castelos são de papel,
todo o meu ouro e seda é a fingir
mas amor eterno posso garantir,
a ti, minha amada donzela..."

Manelinha aceitou, casou.
O tempo passou e guardou
daquele momento louro
o amor, sua riqueza e tesouro.

O primeiro

Nota prévia
Tinha 12 anos e ainda mal gatinhava na descoberta da vida. Aqui, pela primeira vez, descobri que algumas palavras rimavam, mas só algumas, não fosse eu cair na tentação de escrever alguma coisa de jeito. De quando em vez, é bom olhar para o espelho retrovisor...

Meu mar imenso da minha vida
quem me dera sobre ti poder navegar
com a minha nau encantada
para assim para ti poder cantar.

Ó olhos lindos côr do céu,
eu a vós vos invoco
pois pelo poder que me foi concedido
tenho autorização para casar contigo.

Depois de provares o meu amor
e de eu navegar sobre ti,
ó meu bombom
vais ver como é bom!

sexta-feira, outubro 02, 2009

6ª Feira - parte 1

Até que enfim!... Chegou… e eu estou tão… (exausto?)… farto disto. Nem me apetece… A sério… Sinto o latejar… Os olhos pesam… Os papéis misturam-se, caem, procuram dono… Vão-se embora! Deixem-me em paz, por favor… Deixem-me ficar… Eu só quero ficar… E partir sem sair daqui… Um grito mudo preenche o vazio… Chefe: é um bilhete de ida, se faz favor… Não posso? Ainda não são 18 horas?... Vi mal… Até era capaz de jurar, mas… estou demasiado… Os olhos cerram-se mais um pouco… Vou entrar neste avião… e ele que se dane!...
Hummmmm, tão bommmm… Mesmo a apetecer… É só baixar a cabeça… Devagarinho, com calma… Estou pronto! Mesmo bom… Um carneiro, dois carneiros, três carneiros, quatr… Que susto! Maldito telefone! Maldito sejas, que ardas e morras no inferno!... Hã... Perdão. Estou?... Ah, chefe! Sim?... Não me diga!... (não, não)… E isso é para quando?... (para a semana, para a semana, para a)… Tão urgente?... (bolas!)… Pois, entendo, só que… (as horas, os minutos!)… Não, no fim-de-semana não, claro… (escravatura, querias?)… Sim, claro… (vai-te lixar!)… É claro, é claro, apenas julguei… (vai-te mesmo lixar)… Está certo. Vou já tratar disso. (e se te fosses lixar de vez?)… Novo grito mudo…

(o mundo é o rodopio)

Humanos

Somos um cuco esvoaçando
Somos uma sequóia ancestral
Somos a verdade perfeita
Somos um erro fatal.
Somos uma sebe desfeita
Somos o crepúsculo matinal
Somos um beco sem saída
Somos o alcatrão inicial.
Somos uma bicicleta perdida
Somos uma nave espacial
Somos um Verão junto ao Tejo
Somos um Inverno brumal.
Somos o meu e o teu beijo
Somos um eucalipto no Natal
Somos o amor num copo de água
Somos uma fonte visceral.
Somos o prazer e a mágoa
Somos o bem, somos o mal
Somos a antítese e todo o contrário
Somos um humano normal.